quinta-feira, 21 de junho de 2007

Considerações soltas de um debate morno


Considerações soltas de um debate morno

O debate ontem da Sic Not foi morno. Era de esperar que assim fosse, mas desiludiu pela falta de verdadeiro combate político, confronto de ideias e exposição de argumentos. Era difícil fazer melhor neste cenário de 7 concorrentes? Talvez. Mas quem perde são os lisboetas, os que votam, que não conseguiram ver a melhor luz os seus candidatos.
Era espectável que esta primeiro encontro entre os principais candidatos fosse táctico, defensivo e cauteloso. Afinal, ninguém quereria parecer demasiado ansioso, arrogante ou prepotente. Foi, para utilizar uma metáfora desportiva, um jogo de marcações à zona, por vezes num misto zona / homem-a-homem (como o par Sá Fernandes / Telmo Correia), demasiado defensivo e com poucas oportunidades de golo.
No jogo das expectativas António Costa saiu-se muito bem, uma vez que era, à entrada do debate, o alvo a abater por todos os candidatos. Carmona Rodrigues decepcionou por não saber reconhecer a «sua obra» (leia-se o buraco financeiro e a situação de descontrolo que se vive hoje na CML), parecendo viver num outro mundo, enquanto Fernando Negrão apresentou-se como não pertencendo ao baralho lisboeta. As dificuldades em dizer a palavra «Câmara Municipal de Lisboa» foram evidentes (saiu um bom par de vezes «Câmara Municipal de Setúbal). Dos dois esperava-se muito mais. Esperava-se que se apresentassem a disputar a liderança da autarquia, e nunca o fizeram. Carmona só quer ser eleito e ficar à frente de Negrão. Negrão só quer ser eleito e ficar à frente de Carmona. Nenhum deles tem algum plano para a cidade.
Ruben de Carvalho não desiludiu, na medida em que fez o que dele se esperava: não perder votos. Falando exclusivamente para o eleitorado comunista, de Ruben de Carvalho esperava-se que conseguisse sair da cassete PC e entrar pelo menos na «luta das esquerdas» (com Helena Roseta e Sá Fernandes, e António Costa). É uma estratégia inteligente, pois segurando o eleitorado comunista num cenário de grande abstenção pode traduzir-se na manutenção do segundo vereador.
Nas «novas esquerdas», Sá Fernandes desiludiu, e Helena Roseta mostrou que está na luta para a segunda posição. Em Sá Fernandes o problema é… Helena Roseta e… Sá Fernandes. Helena Roseta porque ela apresenta o discurso que ele queria apresentar: o independente, a participação cívica e tal (como o fez há dois anos). O seu segundo problema é ter elevado a sua fasquia a um nível elevado, fazendo que qualquer intervenção mediana seja fraca. Foi o caso. Já Helena Roseta, ocupando com mestria o espaço da «esquerda urbana» tão querida ao BE (não foi por acaso que o bloco tentou até à ultima fundir as duas candidaturas), soube capitalizar a simpatia que promove, em relação a si, à sua candidatura e ao ideal que promove (como antes Alegre o tinha feito). Tem poucas ideias, é inconsequente, mas não interessa. Joga como poucos com a imprensa e será uma força a ter em conta no dia 16 de Julho. Pena é que nem tenha equipa nem projecto.
Telmo Correia teme em não existir.

Vejamos a análise individual

António Costa
Já dissemos que se saiu bem. Foi cauteloso, defensivo e «presidenciável», como referem alguns comentadores. Apesar de gostarmos de o ver em cenários mais ofensivos, mais ainda quando tem claramente a melhor equipa e o melhor projecto, entende-se que nãos e tenha exposto tanto. Afinal era quem tinha mais a perder, se o debate lhe corresse mal. Penso que estará um pouco indeciso entre pedir uma maioria absoluta e estudar as potenciais coligações pós eleitorais. Mostrou porque é o único a concorrer à presidência da CML.

Helena Roseta
Muito inteligente na postura apresentada. O seu charme, pessoal e feminino, funcionou na perfeição. Apesar de demasiado circular no discurso, de apresentar propostas irrealizáveis (como a do comité do urbanismo) escapou ao confronto directo. Mostrou-se elegível, tranquilamente, e começou a negociar com António Costa um cenário pós eleitoral.

Sá Fernandes
Tem um grave problema em Helena Roseta. A presença da arquitecta obriga-o a apostar num jogo mais ofensivo, mais atacante, numa tentativa de [1] solidificar o seu eleitorado e [2] marcar que é a esquerda não comunista (nem socialista) nesta eleição. Foi esse o desenho táctico do ataque a Telmo Correia, que me pareceu mal sucedido e denunciado. Terá dificuldades na campanha em se desligar do elan de Roseta.

Ruben Carvalho
Pouco de novo. Demasiada cassete. Por vezes pareceu-me a Odete Santos, honestamente, não pela emotividade da eterna comunista mas pela sucessão de sondbites e clichés com que nos presenteou. Não se distinguiu em nada, apostando totalmente numa táctica de controlo de estragos em relação ao eleitorado da CDU. É essa a táctica comunista: não perder votos nesta eleição (o que lhe pode manter o segundo vereador)

Telmo Correia
Parece que está a fazer tudo para não ser eleito, o que para o CDS seria uma estreia. Já era difícil com Carmona na corrida, com Maria José Nogueira Pinto a apoiar António Costa e com o CDS numa clara «mó de baixo». É arrasante colocar numa mesma frase a questão homossexual, a toxicodependência e a segurança, parecendo que todos os problemas de segurança da cidade proviessem de toxicodependentes gay. Terá muitas dificuldades.

Fernando Negrão
Não sabia ao que ia. Pareceu distante, pouco informado e incosequente. A tirada de ter colocar pelouro do urbanismo na dependência da presidência da Câmara pelo seu valor simbólico só pode ser piada. E o engano entre Lisboa e Setúbal mostra que nem sabe bem de onde vem, nem o que anda por aqui a fazer. Para quem acusa António Costa de andar colado ao Governo (de onde foi, lembra-se, Ministro até há um mês) é um decalque do PSD de Marques Mendes: nada tem para dizer. Parece perguntar: para Lisboa? A sério?

Carmona Rodrigues
Aquele de quem tinha mais expectativas. Parece ser viver num qualquer sonho utópico, uma vez que não reconhece a situação calamitosa da CML. Há muitos departamentos sem papel higiénico, as dividas a fornecedores são graves, a CML está, na prática, em falência técnica, paralisada e sem credibilidade. O único que parece não o querer ver é Carmona. É um contender, não para a presidência mas para a vereação. Será um bom combate, o das direitas.

Conclusão.
Confirmou-se que apenas António Costa se apresenta como candidato à Presidência da Câmara Municipal de Lisboa, sendo que todos os outros candidatos o são apenas a vereadores. É muito interessante quer a disputa geral pelo segundo lugar, aparentemente aberta entre Helena Roseta, Carmona e Negrão, quer os campeonatos ideológicos, nas direita e nas esquerdas. António Costa, ao ocupar o centro, parece afigurar-se distante destas disputas «partidárias», preocupando-se exclusivamente com o governo futura da cidade (e não com a conquista de alguns desses campeonatos).
Esperam-se mais debates, pelo menos um a 12 (que adivinho seja na RTP) e mais alguns na Sic Not (não sei bem com que critérios, mas não interessa, pois a estação de Carnaxide pode sempre alegar critérios editoriais na escolha dos candidatos).
Deixo uma sugestão: porque não fazer duelos online?


Mais análises do debate aqui (Daniel Oliveira), aqui (Paulo Gorjão), aqui (António Pinto), aqui (CMC).


JRS